quarta-feira, 26 de março de 2008

ALELUIA
LAURO RODRIGUES


Velho pampa lendário de outras eras,
onde se erguem lúgubres taperas,
tripudiando quais flâmulas de luto:
nessas tardes de junho, ao sol poente,
parece-me que sinto o que tu sentes
quando o silêncio do teu campo escuto...

A brisa nas carquejas do varzedo,
chorando, confessa que tens mêdo
de enfrentar esta miséria atroz...
E na tristeza sem fim dos corredores
vibram hinos de brados e clamores
contra as algemas da canalha algoz...

Mas não percebes, decrépito campeiro,
que as rondas do abutre carniceiro,
grasnam sobre ti funéreo agouro;
que és o braço do ¨Gigante¨ que mendiga
e ¨deitado em berço explêndido¨ se obriga
a pedir pão sob um dossel de ouro?...

Esquece as condições de teu presente!
Larga o trôpego andar do indigente
e relembra o que fostes em tempos idos...
Deixa a tua lança, adormecida e quieta!
A guerra é de doutrinas... Vem! Desperta
que os dias de porvir serão vividos...

Pois, pressinto na fome de meu filho
que um vulcão de revolta aclara o trilho
por onde segue a procissão dos pais...
Desperta Rio Grande! Chama o Brasil
antes que a voz da bôca de um fuzil
não lhe consinta despertar jamais...

Pobre Pátria de vinte e tantas zonas
que tem no seu ventre o Amazonas
e agoniza de fome nas cidades...
Zôo de macacos galhofeiros,
plagiando o viver dos estrangeiros
desde o Batismo à Universidade...

Tenho pena de ti, - senzala branca! -
dessa coletividade honesta e franca
que de tanto esperar já desespera...
Tuas vísceras são campos de imundícies,
onde o vírus malsão das canalhices
se robustece, cresce e prolifera...

Enquanto isso, cérebros raquíticos,
- sanguessugas de pântanos políticos! -
fomentam leis que não trescalam nada...
Mas não tarda que a aurora do futuro
tinja de escarlete o céu escuro
dos párias desta estância abandonada...

Nesse dia, meu pampa, os teus heróis,
ostentando nas mãos raios de sóis
e cavalgando fagulhas celestiais,
virão beber na fúria dos motins,
o sangue nutrido nos festins
dos que colheram sem semear jamais...

E, então, o marco de uma nova era,
surgirá num ermo de tapera
substituindo o pedestal de imbuia,
para que o povo todo num só grito,
possa bradar da Terra ao Infinito:
ALELUIA!...ALELUIA!...ALELUIA!...

POST POST

Aleluia é a expressão genuína da poesia gaúcha de raiz. Este poema foi publicado no livro Senzala Branca de um gigante acordado, mesmo morto, enquanto nosso tempo anda dormindo.

Lauro Rodrigues é uma das principais inspirações para o carteiro continuar sendo carteiro, sem a pretensão de ser poeta.

A obra dele fala por si e em qualquer tempo.

Não é necessário contar o porquê da sua invisibilidade na cultura nativa.

Porque outro poeta já disse:

- outra história vem que vai contar.

Bom proveito.
.

Um comentário:

Jean Scharlau disse...

Lauro Rodrigues. Meu pai gostava de sua obra. Ainda assim eu não conhecia nem busquei conhecer nada dela. Eu que gosto de Noel, Jaime, Cenair, Pedro. A partir de agora vou corrigir esta falha cultural.

Tiraste os anúncios. Eu também não os achei compensadores.
Abraço!